quinta-feira, janeiro 18, 2007

Economia abortiva

João César das Neves, esse supra-sumo do catolicismo militante para quem qualquer rasgo de laicismo é sinónimo de nova inquisição e que disse um dia que sexo com preservativo equivale a comer um pastel de nata (ele lá sabe!), é homem que não esconde o seu gosto pela Economia, área que lecciona na Universidade Católica. Tal é a sua queda para o assunto que, aproveitando a proximidade da sua boca a um objecto fálico chamado microfone, o Professor Neves não resistiu a tecer uma comparação curiosa.

Convidado a discursar numa conferência de imprensa subordinada ao tema "Liberalização do aborto e o aumento do número de abortos", Joãozinho, o Católico, fala disso mesmo, do número crescente de interrupções voluntárias da gravidez nos países onde ela foi despenalizada (e não liberalizada, como é seu hábito regurgitar... perdão, dizer). E acrescenta sobre o aborto voluntário e legal: "tem um paralelo económico: a chegada de um produto novo ao mercado" ou que a despenalização da prática em questão é seguida de "uma cultura abortista, em que este passa a ser uma coisa normal, como um telemóvel".

Até ao momento, tanto a Vodafone como a TMN recusaram comentar a sugestão do professor para uma nova linha de mercado, mas a João César das Neves, preocupado que está com a generalização da interrupção voluntária da gravidez, terá talvez falhado a consciência da banalização do aborto na clandestinidade ou, há que lembrá-lo, do aborto legal que mulheres portuguesas levam a cabo do outro lado da fronteira, coisa ao alcance apenas de quem tem dinheiro para isso. É um pouco como comprar um telemóvel mais caro, porque de um modelo exclusivamente espanhol, mas não consta que João César das Neves se tenha alguma vez insurgido contra isso, pelo menos não com a mesma veemência e riqueza de metáforas com que se ergue contra a despenalização em Portugal.

Mas antes de terminar a sua falaça com o fálico microfone, o ilustre Professor de Economia presenteou-nos a nós, descrentes, com um vislumbre de sagacidade. Disse ele que, em caso de despenalização do aborto, "muitos médicos que aleguem objecção da consciência para não realizar a intervenção serão prejudicados". Questionado sobre as suas fontes de informação, como tinha chegado a tais conclusões, João César das Neves respondeu simplesmente: "pensando". Não se sabe se por inspiração divina, mas ele pensou. E falou. Cristo não teria feito melhor.

2 comentários:

RF disse...

A questão que se coloca é a seguinte: se o aborto é ilegal, como é possível quantificar o número de abortos realizados por portuguesas no país e no estrangeiro e poder fazer uma estimativa para concluir que as interrupções voluntárias da gravidez vão aumentar?

Anónimo disse...

Fiquei curioso, rapaz... e a Optimus, tinha alguma coisa a dizer sobre tal afirmação?

Fica a pergunta no ar. :)

Abraço.