Bandeiras alternativas (i) - Irlanda
Movido em parte por esta entrada do Canhoto e após ter tido uns dias para pensar e tomar algumas notas, decidi dar início a um conjunto de três entradas sobre bandeiras alternativas, com vista a uma ideia que será atempadamente publicada numa quarta entrada aqui no Coroas. Mas antes de dar início às "hostilidades", o melhor mesmo é começar por esclarecer o título deste texto.
Não estou a referir-me a hipotéticos projectos de substituição de bandeiras nacionais actualmente em uso. Pelo menos no que à portuguesa diz respeito, está muito bem como está, principalmente no facto de ter-se sabido preservar um brasão com 800 anos de história. Por bandeiras alternativas quero dizer aquelas que, devido ao seu valor histórico, são usadas paralelamente às oficiais sem que compartilhem necessariamente desse estatuto. Ou seja, trata-se de uma representação vexológica que pelo seu papel na História de um país se impõe popularmente como símbolo nacional alternativo, mas não exclusivo. Um exemplo disso mesmo é a Bandeira Verde irlandesa.
A sua origem encontra-se no movimento republicano da década de 1790. Foi usada pelos irlandeses nas revoltas de 1798 e 1803, nas manifestações de 1830 a 1840 contra a Lei da União que fundiu o Reino da Irlanda e o Reino de Inglaterra para criar o Reino Unido da Grã-Bretanha e nos levantamentos de 1916. Um episódio curioso teve lugar nos Jogos Olímpicos de 1906, quando um atleta irlandês, naturalmente integrado na equipa britânica, recusou-se a receber uma medalha sob a Union Jack e conseguiu que em vez dela fosse hasteada a Bandeira Verde (o que eu me ia rir se um catalão conseguisse fazer o mesmo em Pequim).
A harpa é, de resto, um símbolo antigo, popularmente associado aos bardos e mitos celtas de uma Irlanda que escapou ao domínio romano, preservou a sua tradição poética após a cristianização e mantém hoje o gaélico como a sua primeira língua oficial. Em 1534, Henrique VIII de Inglaterra, na qualidade de Senhor da Irlanda, mandava cunhar moeda com a imagem de uma harpa, também presente nas bandeiras do Interregnum Inglês de 1649 a 1660 (ver aqui), das autoridades britânicas em terras irlandesas (ver aqui) e mesmo no estandarte real britânico.
A Bandeira Verde encontra-se, portanto, fortemente ligada à luta irlandesa pela independência e surge, por força do seu peso histórico e carga simbólica, como uma representação vexológica do país paralela à oficial. E não é por a harpa ter sido tão amplamente usada pelos ingleses que a Irlanda deixa de ostentar esse seu símbolo tradicional no seu brasão, bandeira naval, bandeira presidencial (ver aqui) e nas suas moedas de euro.
2 comentários:
Sem sequer imaginar o que vira a seguir, creio que a bandeira que melhor podera identificar este povo de desbravadores do mar, e sem duvida a bandeira branca com a cruz da Ordem de Cristo. Ou nao?
Ou verde com a Cruz de Cristo, que foi a que D. João IV terá usado como estandarte.
Em todo o caso, o objectivo do conjunto de entradas vai ser demonstrar o uso que se pode dar à riqueza vexológica que temos, sem medo do passado recente e sem preconceitos a tudo o que diga respeito a identidade e nacionalidade.
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