Combinado, mas sem bom resultado
Segundo a investigação de um jornalista norte-americano, Israel confidenciou os seus planos de ataque ao Hezbollah antes de 12 Julho, data em que foram raptados os dois soldados israelitas. Surpreendidos? Nem por isso, ou não tivesse sido este um conflito que dá bastantes ares de ter sido preparado. Senão vejamos.
Israel saiu do sul do Líbano há seis anos, setenta e dois meses que o grupo xiita usou para se armar e preparar o terreno. O Hezbollah não acordou de um dia para o outro com um vasto arsenal nas suas mãos, mas recebeu-o ao longo de vários anos, um período de tempo durante o qual pouco ou nada se ouviu da parte de Israel ou dos Estado Unidos: não se bateu com a mão na mesa no Conselho de Segurança, não se insistiu até à exaustão para que se pusesse no terreno a força multinacional que está neste momento a preparar-se, nem se puxou todos os cordelinhos diplomáticos e mais alguns para que o Hezbollah fosse desarmado. Pelo contrário, a coisa processou-se mais ou menos com a conivência de todos. A guerra que estalou há cerca de um mês e terá, espera-se, chegado agora ao fim, não começou do nada com o rapto de dois soldados, mas foi o resultado de um processo de seis anos a que Israel assistiu para agora, com uma aparência de autoridade moral, dar o último toque e desencadear o ataque, argumentando que o Hezbollah está armado até aos dentes... Está assim há anos, não o ficou subitamente quando os soldados foram raptados, e não se percebe porque é que só agora é que os israelitas reagiram.
E como se isso não bastasse, reagiram da pior maneira possível: com um conflito armado contra o Líbano. Ou seja, voltaram a dar ao movimento xiita a sua razão de ser, aquilo que aos olhos da população libanesa justifica a sua existência enquanto grupo armado: a luta contra a ocupação israelita. O Hezbollah vive de mártires, glorifica os que morrem pela sua causa, alimenta-se dessa cultura de martírio e nunca, mas nunca se acaba com um movimento desses com uma resposta militar que apenas vai nutri-lo e dar-lhe mais força. Aliás, basta recordar como até entre grupos religiosos diferentes os guerrilheiros xiitas tornaram-se mais populares, tudo graças aos bombardeamentos israelitas de cidades e aldeias libanesas. O fim do Hezbollah enquanto movimento armado só virá diplomaticamente, quando se lhe esgotar o argumento bélico, quando deixar de ter vitimas árabes a quem acudir e quando o Estado libanês for forte o suficiente para não permitir a existência de estruturas paralelas. E nem nisso a intervenção israelita ajudou, já que pode ter alterado o delicado equilíbrio de poderes no Líbano, com a balança a pender fortemente para os xiitas e, consequentemente, com a possibilidade de se vir a criar mais um país alinhado com o Irão. Pior a emenda...
Sim, o Hezbollah é um grupo armado que atinge indiscriminadamente áreas civis, sim, é um movimento que devia ser desarmado e sim, os países que o têm apoiado devem responder por isso. Mas Israel, por outro lado, é um Estado de Direito, uma democracia, um país soberano com lugar nas Nações Unidas e reconhecido internacionalmente e devia, por isso mesmo, agir com sobriedade e sentido de responsabilidade. Isto é, se de um movimento terrorista eu não espero respeito pela lei internacional ou bom senso natural, já de um país soberano e democrático é justo esperar que ele não reaja a provocações exteriores com a mesma insensatez e agressividade daqueles que o atacam, ao estilo de eu quero, posso e mando. Porque quando assim não é, então bem que se pode argumentar que ao terrorismo do Hezbollah, Israel está apenas a responder com terrorismo de Estado, independemente de ser em legitima defesa ou não.
3 comentários:
Hm..
Tenho que discordar:) Acho que o governo de Israel está a fazer aquilo que os cidadãos esperam que o seu governo faça, ou seja defenderem a população. Não se pode admitir um comportamento ofensivo a uma organização terrorista, mas não o permitir a um estado de direito que se esforça por garantir a segurança dos seus cidadãos. Pensa lá, se vivesses em Israel e todos os dias tivesses medo de sair porque um tóino qualquer podia ter na agenda ir explodir as entranhas para o mercado nesse dia, o que é que esperavas que o governo que tu elegeste e a quem pagas impostos fizesse? Por outro lado, o Líbano enquanto estado e a própria população nunca rejeitaram frontalmente o Hezbollah de maneira a que eles perdessem todo o apoio. Se eles não tivessem lá segurança, não estavam lá. E nisto, cada um tem o que fez por merecer. Só me revolta que hajam crianças enfiadas no meio disto que não tiveram oportunidade de escolher.
Aliás, devo ainda dizer que se o apoio a Israel fosse unânime e não houvessem tantas manifestações "pacifistas", se houvesse uma condenação global d os acéfalos dos fundamentalistas, eles já não cá estavam. Só continuam porque a discórdia entre quem tem poder para lá ir não permite uma acção coerente. E na verdade, esta discórdia muitas vezes nem tem a ver com o próprio conflito em si, é por complexos anti-Bush, anti-USA, por preconceitos, por gente que tem que se armar sempre em boa mostrando que tem a atitude "bem" de condenar tudo o que seja conflito. Mas às vezes é preciso mesmo entrar em conflito para resolver as coisas. Quer seja entre países, quer seja a nível pessoal.
Ui ui excedi-me. Beijinhos:)
Israel ocupou o sul do Libano durante quase duas décadas e durante todo esse tempo, mesmo estando em território do Hezbollah, não foi capaz de acabar com o grupo xiita. O que é que te faz pensar que uma campanha militar de semanas ou poucos meses o vai conseguir?
Pelo contrário, o ataque apenas piorou a situação: aumentou a popularidade do movimento e deu motivos para continuar armado. Porque se Israel já saiu uma vez do Libano e voltou agora, eles bem que podem argumentar que isso pode voltar a acontecer, motivo pelo qual o Hezbollah tem que continuar armado.
A ofensiva israelita é sintomática de um Estado que perdeu qualquer sentido de bom senso e tem como resposta para os seus problemas os mesmos meios que os terroristas: violência desmesurada, insensatez e desdém para com os esforços diplomáticas que, muito embora lentos, são certamente mais construtivos quando levados a sério e com um minimo de sentido de Estado.
"E nisto, cada um tem o que fez por merecer"
Eis o idealismo justiceiro, que me permita a cara Rita, choca pelo pouco ponderado e ingénuo. Nisto, como em tudo, é quem menos merece que paga. Quem fez por merecer, de ambos os lados, certamente não pagará...
Enviar um comentário