quinta-feira, novembro 02, 2006

Catalunha dividida

Porque o governo catalão caiu há uns meses atrás, vítima do processo de revisão da autonomia, os catalães foram ontem chamados a votar para o seu parlamento. Se a Catalunha já parecia estar dividida aquando do referendo ao novo Estatuto, este último acto eleitoral apenas veio confirmar esse dado, com perdas e ganhos de uma ponta à outra do espectro político. A hipótese de um novo governo tripartido não está posta de parte.

Em comparação com os resultados de 2003, a maior perda foi para o Partido Socialista da Catalunha, que de 42 passou para 37 lugares, seguido pelos nacionalistas da Esquerda Republicana que de 23 passaram para 21. Por contraste, a esquerda ecologista da ICV-EUiA tem três novos deputados e fica com 12, enquantos os conservadores catalanistas da CiU afirmam-se como a maior força política da Catalunha, que com dois novos deputados têm agora 48 num universo total de 135 lugares. O Partido Popular passou de 15 para 14 e a grande surpresa é a entrada no parlamento da composição anti-nacionalista Partido da Cidadania com três deputados.

Devido à polémica gerada pelo novo Estatuto de Autonomia, aprovado por referendo no passado mês de Junho e que, entre outras coisas, define a Catalunha como nação, estabelece o dever de conhecimento da língua catalã e permite a retenção em Barcelona de parte das receitas tributárias da comunidade autónoma, as eleições legislativas de ontem foram apontadas como um teste à popularidade dos partidos que intervieram no debate. Os resultados, no entanto, não oferecem um padrão esclarecedor: se é certo que a Esquerda Republicana e o Partido Socialista perderam deputados, dois outros partidos que apoiaram o novo Estatuto - a CiU e a IVC - ganharam outros tantos, enquanto o principal opositor, o Partido Popular, perdeu um lugar no parlamento. O único dado claro é a ascensão do Partido da Cidadania, que se opõe ao dever de saber catalão. De registar ainda a taxa de abstenção de coisa de 43%, a maior desde 1992, e ainda cerca de 60 mil votos em branco. Se o alheamento do eleitorado catalão parece evidente, resta saber porquê, e os resultados das eleições deixam advinhar não um, mas vários motivos espalhados por todo o campo político.

Como vai ser, então, o novo governo da Catalunha? Dado que são precisos 68 deputados para uma maioria absoluta, as hipóteses de coligação são várias. Parece ser certo que será um executivo catalanista, já que apenas o PP e o PC se opõem a orientações fortemente pró-catalãs e os dois juntos não somam mais de 17 lugares. Ao governo central em Madrid, interessado na aplicação do novo Estatuto sem crispações, agradaria mais uma aliança entre a CiU e os socialistas do que entre a primeira e a nacionalista Esquerda Republicana da Catalunha. Ambos os casos permitem uma maioria absoluta, mas a hipótese de recuperar o anterior tripartido entre PSC, ERC e ICV não foi ainda eliminada. A concretizar-se, a CiU ficaria uma vez mais na frustrante situação de ser a força política com mais deputados, mas ainda assim oposição. Um governo nacionalista composto pela ERC e a CiU é pouco provável: a primeira não esconde a sua inclinação independentista, mas a segunda prefere ser apenas autonomista e o seu anterior líder chegou mesmo a aproximar-se do PP.

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