quinta-feira, novembro 02, 2006

Se eu fosse um iberista

Se eu fosse um iberista, não defenderia uma união entre Portugal e Espanha. Isto pode parecer contraditório, mas o facto é que o país vizinho não é um Estado uniforme e mononacional, mas sim plurinacional. E se se quer uma união ibérica efectivamente justa e equitativa, pois então que seja uma em que todas as nações da península estejam em pé de igualdade e não como meras províncias autónomas dessa falácia histórico-linguística que é a "nação espanhola", com a qual, aliás, a própria Constituição de Espanha de 1978 tem dificuldades em lidar. Senão vejamos o artigo 2º:

La Constitución se fundamenta en la indisoluble unidad de la Nación española, patria común e indivisible de todos los españoles, y reconoce y garantiza el derecho a la autonomía de las nacionalidades y regiones que la integran y la solidaridad entre todas ellas.

Ora, se o texto constitucional admite que há nacionalidades às quais se atribui autonomia, então a conclusão óbvia é que há várias nações dentro do Estado espanhol. O atributo não existe sem o objecto do qual ele emana, esteja ele em potência ou em acto. Se a Constituição é incapaz de o concluir isso deve-se, por um lado, ao tique franquista de uma Espanha una e monolingue tentada há tão pouco tempo e, por outro, à própria história da formação do reino espanhol, tantas vezes feita da junção de países independentes cuja autonomia dentro da união acabou por ser anulada, por vezes com recurso às armas. Dois exemplos disso mesmo são a Doma e Castração do Reino da Galiza no século XV e os decretos de Nueva Planta para a Catalunha em 1716, que puseram termo a leis, administração e uso da língua nativa, num esforço de criação de uma Espanha centralizada e una. A mesma que a Constituição espanhola quer afirmar, ao mesmo tempo que admite a existência de nacionalidades autónomas. E numa altura em que estas estão novamente em ascensão, a "nação espanhola" começa a mostrar as suas contradições.

Se eu fosse um iberista, defenderia uma união ibérica entre pelo menos cinco Estados independentes: Portugal, Galiza, País Basco, Catalunha e a tal "Espanha". E digo pelo menos porque não ponho de parte a possibilidade de Leão, Aragão, Cantábria e Andaluzia concretizarem a sua autodeterminação. Portanto, que se fragmente primeiro o Estado espanhol nas partes nacionais que o compõem e depois sim, quando todas estiverem em pé de igualdade política, que se decida se se avança ou não para um Estado único.

Já agora, se eu fosse iberista também não me colaria muito ao José Saramago. Pode ser Nobel da Literatura com todo o mérito, mas quando se trata de política - linguística incluída - ele raramente manda uma p'ra caixa.

8 comentários:

Anónimo disse...

Caro Heliocoptero, não é corrente o uso do termo "multinacional" no sentido em que o empregas; penso que "plurinacional" é o mais indicado.

De resto, coincido.

Faz o melhor uso possível desta "pinha" que a energia é uma espécie em vias de extinção....

Héliocoptero disse...

Agradecido pela dica ;)

Al Cardoso disse...

Parece que felizmente nao e Iberista, eu tambem nao sou gracas a D*us.
Se conseguimos sobreviver como nacao independente por quase novecentos anos (com a excepcao dos sessenta com rei conjunto) porque razao nos temos que unir agora?
Saramagos, Linos e Socrates se gostam tanto de Espanha, que vao para la que ate nos fazem um favor.

Héliocoptero disse...

Não, não sou iberista. Muito pelo contrário!

Mas mesmo não o sendo, acho que a questão está actualmente posta do modo errado: se se quer propôr uma união justa, pois então que seja uma em que as nações ibéricas estão em pé de igualdade. Continuar a aceitar a Espanha una e indivisível equivale à nossa entrada nessa falácia e consequente absorção, tal como quase aconteceu no passado. E Espanha não dorme em serviço.

Héliocoptero disse...

E sim, o Saramago bem que podia mudar de vez de país. Uma coisa é ser português e ter uma determinada opinião política; outra coisa é estar constantemente a denegrir e rejeitar o seu próprio país. Ninguém o obriga a ser português, pode sempre naturalizar-se "espanhol".

Chegou até a afirmar que numa união ibérica o português teria o mesmo estatuto que o galego na Galiza e o catalão na Catalunha. Ora, um dos mínimo de justiça numa união seria a reciprocidade linguística, logo não se percebe porque é que em Portugal o português havia de ser co-oficial com o castelhano, e em "Espanha" apenas o castelhano seria oficial. Porque é esse o estatuto do galego e do catalão: partilhados com o espanhol nas suas terras nativas, parcos em direitos fora delas.

E é-me a abécula escritor e um Nobel da Literatura. Tem cá um carinho pela sua língua-mãe...

Rui Maio disse...

é nestas alturas (quando vejo muitas "simpatias" entre governantes dos dois países) que me apetece dizer: então andou o Afonso Henriques à cabeçada com a mãe para quê? ele nem sequer era português! já para nem falar dos que se lhe seguiram!
se é para ser espanhol então quero tudo aos preços de lá: electricidade, casas, carros, roupa, alimentação, impostos e não sei se mesmo assim me convencem!

PS - (e sem querer ser muito exacerbado na paixão que tenho pelo meu país) VIVA PORTUGAL!

Anónimo disse...

Hola, he encontrado este blog de casualidad y creo que merece la pena detenerme un momento a dar mi opinión. No te escribo directamente en portugués porque no lo domino lo suficiente, pero todo llegará, estoy aprendiendo. Yo te escribo como iberista convencido, quizá ya me conozcas, veo que tienes entre tus links el Racó Català, suelo participar allí (me llamo Hartigan en esta web). Tal y como tú dices, siendo iberista defiendo que la unión no sería entre dos bloques (España y Portugal), sino entre los diversas partes que conforman España (Cataluña, Euskadi, Asturias, Canarias, etc...), y Portugal. Por lo de si debería primero fragmentarse España para luego llegar a una unión mayor, creo que es discutible, ya que una nueva articulación del estado en un sistema federal o confederal podría hacer innecesario esa división previa.

Un saludo.

Hartigan.

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Hello, eu acredito que vale a pena o problema para dar minha opinião. Eu não lhe escrevo diretamente no português porque eu ainda não o domino, mim estou aprendendo. Talvez eu escrevo-lhe gosto convencido que o iberista, me conhece, tem entre suas ligações o Racó CatalÃ, terra para participar lá (eu sou chamado Hartigan nesta correia fotorreceptora). Assim e enquanto você diz, sendo iberista eu defendo que a união não estaria entre dois blocos (Spain e Portugal), mas entre as peças diversas que se conformam Spain (Catalonia, Euskadi, Astúrias, os consoles amarelos, etc....), e Portugal. Se Spain tiver que fragmentar logo para chegar em uma união mais grande, eu acredito que é discutível, desde que uma junção nova do estado em um sistema federal ou confederal poderia fazer essa divisão precedente desnecessária.

Um cumprimento.

Hartigan.

Héliocoptero disse...

ehCaro Hartigan:

Nações que entrem numa federação ibérica enquanto comunidades autónomas de um Estado já existente e não na qualidade de Estados independentes que decidem fazê-lo por sua completa e livre vontade será sempre uma união ibérica podre. Seria o mesmo que formar um grupo em que uns entram por sua vontade e outros porque alguém decidiu por eles.

Faça você mesmo o teste: comece a fazer campanha pela instituição do direito à auto-determinação das comunidades autónomas por via de referendos e logo vê quão interessada está Espanha em que as suas várias nações falem por si mesmas e não unicamente por via de Madrid. Se nem sequer aceita que a Catalunha ingresse na francofonia ou a Galiza na CPLP, como é que pode falar de uma união ibérica justa e equitativa sem primeiro dar independência às comunidades autónomas para que elas tenham uma voz efectivamente sua?

Já agora, não sei se o dei a entender de um modo claro, mas eu não sou, nem nunca fui iberista. Longe disso!